sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Fígado - iecur ficatum


Fígado (Sírio Possenti)

Meu exemplo preferido de história das palavras é ‘fígado’. É que essa palavra exibe simultaneamente dois fenômenos históricos fundamentais. Em muitos lugares, lê-se apenas que ‘fígado’ veio do latim ‘ficatum’. Em lugares um pouco salubres, se explica que houve um processo altamente geral de sonorização de consoantes surdas em posição intervocálica e que se vê aplicado nessa palavra (c > g, t > d). A consoante inicial (f) permaneceu surda porque não está entre vogais.
Mas o mais interessante, talvez, é que ‘ficatum’ não tinha nada a ver com esse órgão dos animais. ‘Ficatum’ tinha a ver com figos, era algo afetado, mudado, marcado pelo figo. O órgão se chamava ‘iecur’, em latim. ‘iecur ficatum’ era o fígado que resultava da alimentação (superalimentação, na verdade) de animais com figos (assim como ‘drogado’ é o que está em certo estado porque consome drogas – ou o que é viciado nelas).
Mais especificamente, tratava-se dos gansos, que produziam o fígado gordo, o ainda famosofois gras. O que aconteceu? Uma belíssima metonímia: o órgão passou a ter o nome que tinham alguns de seus exemplares (nem todos os fígados eram ‘figados’) quando seus donos comiam muito figo.
Etimologia de 'fígado'
Em sua origem, a palavra 'fígado' nada tinha a ver com o órgão dos animais. 'Ficatum' estava relacionada a figos. O órgão se chamava 'iecur' e 'iecur ficatum' significava 'fígado de ave engordada com figos'. Ou seja, o órgão passou a ter o nome que tinham alguns de seus exemplares. (imagens: Wikimedia Commons)
Mas não se pense que o povo chama o fígado de ‘figo’ (‘estou com dor no figo’) porque mantém essa memória. Aqui, o processo é outro, o da redução, muitas vezes atestada, de proparoxítonas em paroxítonas; ou seja, trata-se do mesmo fenômeno que transforma ‘xícara’ e ‘abóbora’ em ‘xicra’ e ‘abobra’, no português popular. 

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

Agora em Cordel: A Privataria Tucana


A Privataria Tucana em cordel


Silvio Prado

Caiu a casa tucana
Do jeito que deveria
E agora nem resta pó
Pois tudo na luz do dia
Está tão claro e exposto
E o que ninguém sabia
Surge revelado em livro
Sobre a tal privataria.

Amauri Ribeiro Junior
Um jornalista mineiro
Em mais de 300 páginas
Apresenta ao mundo inteiro
A nobre arte tucana
De assaltar o brasileiro
Pondo o Brasil à venda
Ao capital estrangeiro.


Expondo a crua verdade
Do Brasil privatizado
O livro do jornalista
Não deixa ninguém de lado
Acusa Fernando Henrique
Gregório Marin Preciado
Serra e suas mutretas
E o assalto ao Banestado.

Revelando em detalhes
Uma quadrilha em ação
O relato jornalístico
Destrói logo a ficção
De que político tucano
É homem de correção
Mostrando que entre eles
O que não falta é ladrão.

Doleiros e arapongas
Telefone grampeado
Maracutaias financeiras
Lavagem por todo lado
Dinheiro que entra e sai
Além de sigilo quebrado
Obra de gente tucana
Na privatização do Estado.

Parece mas não é
Ficção esse relato
Envolvendo tanta gente
E homens de fino trato
Que pra roubar precisaram
Montar um belo aparato
Tomando pra si o Estado
Mas hoje negam o fato.

Tudo isso e muito mais
Coisas de uma gente fina
Traficantes de influência
E senhores da propina
Mostrando como se rouba
Ao pivete da esquina
E a cada negócio escuso
Ganhando de novo na quina.

Se tudo isso não der
Pra tanta gente cadeia
Começando por Zé Serra
Cuja conta anda cheia
O Brasil fica inviável
A coisa fica mais feia
Pois não havendo justiça
O povo se desnorteia

Com CPI já pensada
Na câmara dos deputados
Não se fala outra coisa
No imponente senado
Onde senhores astutos
E tão bem engravatados
Sabem que o bicho pega
Se tudo for investigado.

Por isso, temos tucanos
Numa total caganeira
No vaso se contorcendo
Às vezes a tarde inteira
Mesmo com a velha mídia
Sua indiscreta parceira
Pelo silêncio encobrindo
Outra grande roubalheira.

São eles amigos da Veja
Da Folha e do Estadão,
Da Globo e da imprensa
Que distorce a informação
Blindando tantas figuras
Que tem perfil de ladrão
Mostrando-os respeitáveis
Como gente e cidadão.

Pois essa mídia vendida
Deles eterna parceira
E que se diz democrática
Mas adora bandalheira
Ainda não achou palavras
E silenciosa anda inteira
Como se fosse possível
Ignorar tanta sujeira.

Ela que tanto defende
A liberdade de imprensa
Mas somente liberdade
Pra dizer o que compensa
Não ferindo interesses
Tendo como recompensa
Um poder exacerbado
Que faz toda a diferença.

Mas neste livro a figura
Praticamente central
Sujeito rei das mutretas
Um defensor da moral
É o impoluto Zé Serra
Personagem que afinal
Agora aparece despido
Completamente venal.

É o próprio aparece
Sem retoque nem pintura
Tramando nos bastidores
Roubando na cara dura.
É o Zé Serra que a mídia
Esconde e bota censura
Para que o povo não veja
A sua trágica feiúra.

E ele sabe e faz tudo
No reino da malandragem
Organiza vazamentos
Monta esquema de lavagem
Ensina a filha e o cunhado
As artes da trambicagem
E como bandido completo
Tenta preservar a imagem.

Mas agora finalmente
Com a casa já no chão
E exposta em detalhes
Tão imensa podridão
Que nosso país invadiu
Com a privatização
Espera-se que Zé Serra
Vá direto pra prisão.

E pra não ficar sozinho
Que ele vá acompanhado
Do Fernando ex-presidente
Mais o genro dedicado
Marido da filha Mônica
E outro homem devotado
Ricardo Sergio Oliveira
E também o Preciado.

Completando o esquema
Deixando lotada a prisão
Ainda cabe o Aécio
Jereissati e algum irmão
Nunca esquecendo o Dantas
Que só rouba de bilhão
E traz guardado no bolso
O tal Gilmar canastrão.

Como estamos em época
De Comissão da Verdade
Que se investigue a fundo
E não se tenha piedade
Dos que usaram o Estado
Visando a finalidade
De praticar tanto crime
E ficar na impunidade.

Tanto roubo descarado
Provado em documento
Não pode ser esquecido
E ficar sem julgamento
Pois lesou essa nação
Provocando sofrimento
A quem sofre e trabalha
Por tão pouco vencimento.

Que o livro do Amauri
Maior presente do ano
Seja lido e comentado
Sem reservas nem engano
Arrebentando o esquema
Desse grupo tão insano
Abrindo cela e cadeia.
Pra todo bandido tucano.