quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Exercício e Asma e broncoconstricção

Os mecanismos subjacentes de Broncoconstricção induzida por exercício e Asma induzida por exercício são multifatoriais complexos.

Chan-Yeung et al, na década de 1970, identificou que a severidade da constricção da via aérea estava associada com nível de ventilação.

Na ventilação nasal normal, o ar inspirado é aquecido à temperatura corpórea e é completamente saturado com água no início das vias aéreas.

Ocorre um grande aumento no nível de ventilação durante exercício extenuante, e cavidade nasal é incapaz de condicionar todo o ar, que acaba chegando em vias mais distais disparando mudanças térmicas e osmóticas.

A perda de água na camada fluida periciliar das vias aéreas produz um ambiente hiperosmótico que pode estimular a degranulação dos mastócitos da mucosa pulmonar que liberam vários mediadores da inflamação, tais como histamina, leucotrienos, prostaglandinas, fator ativador de plaquetas e neuropeptídeos a partir de nervos sensitivos.

A liberação de mediadores estimula esparmos no músculo liso brônquico e, ocorre ainda um aumento da circulação sanguínea brônquica ocasionando congestão sanguínea nos capilares e gerando edema intersticial que intensificaria a obstrução.

Trecho do livro

Exercise-Induced Bronchoconstriction and Asthma.
Evidence Reports/Technology Assessments, No. 189.
Dryden DM, Spooner CH, Stickland MK, et al.

Disponível através do PUBMED.

Darcy Ribeiro - A Formação do Povo Brasileiro, eu me lembro dele vejo esta pesquisa

PARA LER MAIS, acesse


"publicado esta semana na revista PLoS One reforça que o segredo para identificar nossos ancestrais está nos genes. E surpreende ao provar que, de Norte a Sul do Brasil, é dos europeus o maior índice de contribuição genética – pelo menos 60% – para a formação do nosso povo.
O estudo surpreende ao provar que, de Norte a Sul do Brasil, é dos europeus o maior índice de contribuição genética para a formação do nosso povo
Já era de se esperar que a ancestralidade europeia predominasse sobre a africana e a indígena nas regiões Sul e Sudeste do país. O inesperado foi encontrar o mesmo resultado, ainda que com pequenas variações proporcionais, no Norte e no Nordeste, onde o número de pardos e negros sempre superou o de brancos.

terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Sobre o saber científico...

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"Para Fleck (1986), quando a teoria dominante ou estilo de pensamento está devidamente instaurado, passa por um período clássico constituindo a “harmonia das ilusões” e, nesta fase, só se observam fatos que se encaixam perfeitamente na teoria dominante."
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Scheid, Ferrari e Delizoicov, 2005.
Ciência & Educação, v. 11, n. 2, p. 223-233

Seu pai e sua mãe são imortais, sabia? (ou quase!)

Olhe, minha querida colega, você traz consigo os genes de seus pais (embora não todos de ambos) mas traz consigo as informações que antes estavam em seus pais. E mesmo quando o corpo de seu pai ou de sua mãe, não mais estiverem presentes, suas informações ainda estarão em você.
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A vida é um contínuo. Você continua a vida que havia antes, e seus filhos continuarão após você.
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Ok, você pode até dizer, e seu eu não tiver filhos!
Não importa, a não ser que ninguém mais os tenha!
Pra dizer a verdade, não importa mesmo que ninguém (humano) mais os tenha, pois outros seres vivos podem continuar gerando filhos.
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E você e seus irmãos são filhos de seus pais. E eu, você e seus irmãos somos tataranetos de nossos tataravós.
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E alguns tataravós mais no passado e todos os seres vivos se encontrarão - A origem.
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A vida é apenas uma. Um novo ser vivo não aparece. Ele apenas continua a vida que já se iniciou.
Da mesma forma, não se morre, a vida continua sempre.
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Não há duas vidas, mas apenas a vida.
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A célula é um monte de moléculas reagindo...

Uma célula é constituída por substâncias inorgânicas e orgânicas.
As substâncias inorgânicas são a água, os minerais, gases.
As substâncias orgânicas são carboidratos, lipídios, proteínas, ácidos nucléicos.
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A célula é um universo em que estas moléculas interagem, e como resultado conseguimos verificar a estruturação e manutenção de estruturas (membranas, arranjos protéicos, estoques de carboidrato ou lipídio, cromossomos).
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Mas dá para ignorar um pouco as estruturas maiores (organelas e estruturas como os cromossomos) e pensar basicamente em termo de substâncias.
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Assim,
Um código presente no DNA permite a formação de PROTEÍNAS, por intermédio de RNA.
As proteínas formadas ou estruturam as células, ou atuam sobre as substâncias.
As proteínas podem montar ou desmontar carboidratos, lipídios, DNA, RNA, e as próprias proteínas.
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Isto tudo ocorre com consumo de energia, boa parte da qual se perde, sendo necessário sempre a entrada de mais energia no sistema celular, para que ele funcione.
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O DOGMA CENTRAL

Estudar genética é um desafio para qualquer estudante, por diversos motivos, mas especialmente porque exige a união da compreensão do funcionamento do corpo ou de uma célula aliada à compreensão de fenômenos bioquímicos, e a consequente necessidade de estudar moléculas e seus metabolismos. Isto pode ser muito abstrato para alguns!
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Eu então diria para você tentar simplificar os conceitos na medida do possível. Mas isto nem sempre será possível.
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Algumas coisas necessárias para pensar (embora simplificadas):
- Um organismo pode ser interpretado como uma fábrica;
- Esta fábrica não pára de funcionar totalmente, a não ser que "morra";
- Seu funcionamento é o funcionamento de diversos pequenas máquinas;
- O que faz esta fábrica funcionar são máquinas chamados de proteínas;
- Algumas proteínas são como operárias, ou seja, realizam funções de construção ou destruição;
- Outras proteínas se parecem mais com alguns objetos que existem na fábrica, tais como parafuso, escadas, que estruturam a fábrica;
- Trazendo de volta à célula, as proteínas realizam ou ação estrutural ou ação enzimática;
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- Nem tudo que existe nesta fábrica são seus operários e seus objetos estruturais;
- Existem produtos que servem para serem alterados, transformados, modificados;
- Imagine por exemplo, uma fábrica que tenha plástico como matéria prima para a fabricação de bonequinhos;
- Temos o operário que utiliza a matéria prima e a transforma no objeto desejado;
- O operário é a proteína catalisadora (enzima) da reação de transformação do substrato em um produto (metabolismo);
- Assim, já temos nesta fábrica, as proteínas e seus substratos (que podem na verdade ser todas as substâncias inclusive outras proteínas).
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- Mas, como esta proteína enzimática (operário) consegue realizar a ação específica?
- Bem, imagine que o operário do plástico tem todas as informações para realizar a tarefa. E tem isso devido a sua formação;
- As proteínas são assim na sua formação, cada proteína é estruturada e de acordo com sua estrutura ela realiza determinada tarefa;
- A ação de uma proteína depende de sua estrutura (forma);
- E a forma da proteína depende da sequência de seus aminoácidos (tijolos básicos da proteína);
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Disto resulta o seguinte,
- um operário mal formado não consegue exercer sua função;
- bem como uma proteína mal formada também não.
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Um operário pode ser forjado em um curso (por exemplo, no SENAI) e ser resultado de toda uma codificação complexa - o estudo realizado durante o curso;
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A proteína também é forjada a partir das instruções presente em curso - e os códigos estão no DNA.
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Assim, temos que as informações presentes no curso de plástico (do SENAI) forma o operário;
E, as informações presentes no DNA forma a proteína;
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Acontece que a proteína não pode ser formada diretamente do DNA, sendo necessário um etapa intermediária, a formação de RNA.
É como se a partir das informações dos livros do curso de plástico fosse necessário que professores ensinassem os operários (passasse a informação dos cursos para os operários);
Da mesma forma, para a formação de proteínas, a informação contida no DNA é passada para o RNA, e então a partir da informação presente no RNA ocorre a produção da proteína.
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Todo este processo, este fluxo de informação e ação é conhecido como DOGMA CENTRAL DA GENÉTICA.
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domingo, 20 de fevereiro de 2011

Cromossomo Y

http://cienciahoje.uol.com.br/colunas/por-dentro-das-celulas/uma-doce-batalha-entre-os-sexos


Os cromossomos X e Y
Em mamíferos, os machos possuem dois cromossomos sexuais diferentes (XY) e são, portanto, heterogaméticos. O sexo é determinado pelo cromossomo Y, que é herdado exclusivamente da linhagem masculina. Apesar de sua importância, o cromossomo Y representa apenas 0,38% do genoma humano e é assim denominado porque se assemelha a uma letra Y quando analisado sob microscopia. Raciocínio idêntico pode ser feito para o cromossomo X.
Cromossomos sexuais
Cromossomos sexuais X e Y do homem,com a região pseudoautossômica do braço curto das moléculas (PAR1) marcada em verde (foto: Steffen Dietzel).
O cromossomo Y possui duas regiões similares ou homólogas ao cromossomo X que são responsáveis pelo pareamento dessas moléculas durante a divisão celular. Essas regiões, chamadas pseudoautossômicas (PAR1 e PAR2), estão localizadas nas extremidades do braço longo e do braço curto do cromossomo Y.
Contudo, cerca de 95% do cromossomo Y  não se recombinam com o cromossomo X. Essa região, conhecida como NRY (do termo inglês Non-Recombining Region), possui genes em um estado individualizado ou haploide, que, por isso, são transmitidos diretamente entre os pais e seus filhos do sexo masculino.
Por vários anos acreditou-se que o cromossomo Y fosse similar a um “deserto” que conduzia apenas um gene, conhecido como SRY (do termo inglês Sex Determining Region), relacionado com a determinação do sexo. Porém, pesquisas recentes revelaram que o cromossomo Y é bem mais rico: nos homens, por exemplo, ele possui 86 genes – a maior parte presente em NRY –, que codificam 23 proteínas, muitas das quais produzem características distintivas do sexo masculino ou holândricas.
Alguns genes identificados na região NRY estão associados à manutenção da fisiologia celular. Contudo, nessa região existem 10 genes expressos apenas nos testículos e que estão envolvidos com o controle da produção e diferenciação de espermatozoides. Pacientes que têm deleções ou mutações em NRY apresentam um número reduzido ou uma ausência total de espermatozoides em seu sêmen.
Os genes na região NRY são expressos em cópias múltiplas. Esse padrão de ocorrência aumenta a eficiência da espermatogênese e diminui a influência de deleções ou mutações sobre esse processo. Esse tipo de arranjo também permite que esses genes apresentem diferenças em suas sequências e criem combinações de variantes gênicas ou alelos para cada indivíduo. Contudo, não está definido claramente ainda se existe uma relação entre a composição da região NRY e um maior sucesso em termos de seleção sexual.
Os genes presentes em 95% do cromossomo Y influenciam aspectos envolvidos na seleção sexual na vida adulta
Outros genes do cromossomo Y estão associados com o controle do desenvolvimento embrionário, da estatura e do crescimento de dentes. Em várias espécies de mamíferos, embriões XY desenvolvem-se mais rapidamente até a metade da gestação do que embriões XX. Isso se reflete em um número maior de blastômeros e somitos, além de maior peso e tamanho corporal ou da cabeça. Esses processos parecem ser controlados por um único gene, denominado controlador do desenvolvimento do cromossomo Y ou GCY (do termo inglês Growth Control Y).
Os genes presentes em NRY influenciam aspectos envolvidos na seleção sexual na vida adulta. Alguns exemplos são os genes associados a um maior tamanho corporal e ao desenvolvimento de dentes, fatores importantes em processos de disputa territorial e pela atenção de fêmeas. Mas como essas descobertas sobre a biologia do cromossomo Y estão relacionadas à seleção sexual?

Fazendo a vida. O pai de um novo ser vivo sem pai.

Você, caro amiga(o) aluna(o) de genética do curso de Odontologia, talvez tenha visto, e até procurado ler mais, mas se não foi o caso, procure entender o feito realizado por a equipe comandada por CRAIG VENTER.
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Mycoplasma mycoides JCVI-syn1.0 - o primeiro ser vivo filho de um computador.
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http://revistapesquisa.fapesp.br/?art=4154&bd=1&pg=1
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Da mesma forma como estudamos recentemente as pesquisas realizadas por Griffith, MacLeoad, MacCarthy e Avery, CERTAMENTE no futuro (e já no presente) estudaremos como parte da HISTÓRIA DA GENÉTICA os experimentos (TECNOLOGIAS) desenvolvidas por este grupo - o de Craig Venter.
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Acesse o link anterior para visitar a Revista Pesquisa FAPESP. E boa leitura!

A louca boate da energia

Oi, é bom você ir se acostumando com a 1ª e a 2ª leis da termodinâmica.
Pra dizer a verdade, você já está acostumado, apenas às vezes não sabe disto.
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Um texto sobre a importância do desequilíbrio está na matéria da Revista Ciência Hoje. Siga o link abaixo:

http://cienciahoje.uol.com.br/colunas/fisica-sem-misterio/o-equilibrio-e-mesmo-necessario

sábado, 19 de fevereiro de 2011

Conventional wisdom of how neurons operate challenged: Axons can work in reverse

Conventional wisdom of how neurons operate challenged: Axons can work in reverse

QUANDO A CONSCIÊNCIA E A CORAGEM FALAM MAIS ALTO

Pensando sobre PATOGÊNESE de aterosclerose

Amigos da Odontologia estamos estudando Genética juntos, e esta postagem interessa de certa forma a você. Enquanto os amigos da Biomedicina, cursando POS, poderão apreciar um mecanismo envolvido na patogênese da aterosclerose.
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Este texto foi baseado principalmente em :
um texto de divulgação científica no site sciencedaily.com publicado ontem.

e na leitura atenciosa de:

Robert S. Schwartz, Holger K. Eltzschig, Peter Carmeliet.Hypoxia and InflammationNew England Journal of Medicine, 2011; 364 (7): 656 


Fu et al.: Hypoxia stimulates the expression of macrophage migration inhibitory factor in human vascular smooth
muscle cells via HIF-1a dependent pathway. BMC Cell Biology 2010 11:66.

mas utilizou também outras fontes. As ilustrações estão disponíveis no Wikipedia.
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SÁBADO, 19 DE FEVEREIRO DE 2011 – 12:00 HORAS am (até às 14:30)

Durante a hipóxia, o HIF-1α expresso é estabilizado e não degradado. A sua disponibilidade permite que atue como fator de transcrição de diversos genes.
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Uma das proteínas reguladas por este fator de transcrição é MIF  (Macrophage migration Inhbitory Factor). Voltaremos daqui a pouco a ela, antes devo dizer que:
“durante a hipóxia, radicais livres (espécies reativas do oxigênio) e uma enzima cinase regulada por sinais extracelulares (ERK) são ativados, e são essenciais para a expressão de MIF.”
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Bem outra informação relevante é a de que, sob hipóxia, células musculares lisas vasculares multiplicam-se por ação do MIF, e esta proteína, ainda, estimula a migração dos macrófagos.
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Eu sei, agora, você pode ter ficado confuso com o nome da proteína afinal a tradução de Macrophage migration Inhbitory Factor é, literalmente, Fator Inibidor da migração de macrófagos!!!!! Mas, o que ocorre é o seguinte, o MIF tem ação pró-inflamatória (permitindo a migração de macrófagos), e faz isto inibindo o sinal ANTI-inflamatório de fármacos glicocorticóides. Estes fármacos importantes são largamente utilizados para reduzir fortemente o estado inflamatório, aliviando a sintomatologia do paciente. Mas seu uso inadequado tem efeitos colaterais importantes.
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Resumindo, sob hipóxia HIF-1α estimula MIF que estimula a proliferação de células musculares lisas de vasos sanguíneos e a migração de macrófagos na parede de vasos sanguíneos.
Estes achados podem ser importantes para entender a patogênese da ATEROSCLEROSE progressiva, uma vez que os macrófagos são células centrais neste distúrbio vascular.



Sobre eugenia no Brasil e algumas de suas consequências

O trecho a seguir é do artigo científico A Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo
e a reconfiguração da identidade profissional da Enfermagem Brasileira, de Campos & Oguisso (2008).


Sintomaticamente, a instauração da República evoca um dos grandes momentos da saúde pública brasileira, assim como recupera um dos marcos da história da enfermagem no Brasil, conhecida como Missão Parsons
(9). A historiografia dominante indica que as vicissitudes do novo regime resultaram em reformas sanitárias,
instauração de políticas de saúde pública, criação de campanhas, ligas, associações, escolas e outros espaços institucionais, reafirmando que a questão da saúde no Brasil polarizou os investimentos durante a Primeira República (1889-1930).

Concentrados em esforços políticos, os movimentos em torno da saúde pretendiam reverter a representação do país, visto como um local impuro, viciado, pestilento, propício ao desenvolvimento de doenças, inclusive, por sua característica maior, a miscigenação de sua população. Econômica e politicamente desfavorável, a
visibilidade dominante deveria ser alterada. Para tanto, cidades foram higienizadas, habitações populares e coletivas destruídas, ruas e avenidas remodeladas e a população branqueada com a entrada massiva de imigrantes, o que também preocupava médicos, sanitaristas e eugenistas que viveram no século passado. A
comunicação proferida por Renato Kehl, um ilustre médico do período, durante os eventos do Primeiro Congresso Brasileiro de Eugenia, realizado no Rio de Janeiro, em 1929, permite entrever as representações do negro no Brasil:

"Senhores, O Brasil precisa augmentar o seu stock de homens
válidos. O poder de uma nação se aquilata pelo valor dos indivíduos
que a integram. Nada se diz de novo quando se affirma “que não
existe interesse ou bem estar da sociedade distincto do interesse e
bem estar de seus membros”. O nosso stock de homens, physica e
mentalmente superiores, é diminuto (...) Pergunto a mim mesmo:
será isso conseqüência da mistura das raças, será isso o que pintou
Paulo Prado no “Retrato do Brasil”? Será um mal insanável? (sic)
(10)
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A República nascia com a missão de regenerar o país ainda atado ao seu passado colonial. No pensar das elites políticas e dominantes, a profilaxia, a saúde pública e as mudanças de hábitos cotidianos conduziriam os brasileiros para o estado mais avançado da vida em sociedade. Tais protocolos impunham regras para morar,

vestir-se, comer, cuidar da saúde, projetados por discursos médicos que visavam controlar o social. Entretanto, como analisou Jurandir Freire Costa, a imposição das normas médicas redefiniram a visibilidade do negro “...fazendo-o portador de uma força incoercível, a força da doença e da imoralidade...”
(11)
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Para o alcance dos objetivos propostos pela República (sanar um país doente) era preciso controlar as populações, interromper os “vícios da hereditariedade”, os desvios da moral, originários da mistura racial. Identificados como inferiores, a imensa maioria de negros, pardos, mulatos, pretos, assumiam funções sociais
desprestigiadas, dificultando ainda mais a participação do negro na sociedade mais ampla e, no caso específico, impedindo que mulheres negras ingressassem na enfermagem profissional. No âmbito específico da enfermagem brasileira, Barreira permite considerar que as representações dominantes, construídas sobre
os negros, influenciaram a formação da liderança da enfermagem nacional. De acordo com a autora, “...várias das candidatas que atenderam aos apelos humanitários e patrióticos dos médicos sanitaristas provinham da classe média alta da sociedade, muitas delas tendo sido diretamente por eles recrutadas. Não obstante,
candidatas oriundas de famílias pobres poderiam ser bem recebidas, mas o mesmo não ocorreria com as candidatas negras...”
(11)
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sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Tenha consciência... e entenda....

O Operário Em Construção

Por Vinicius de Moraes

E o Diabo, levando-o a um alto monte, mostrou-lhe num momento de tempo todos os reinos do mundo. E disse-lhe o Diabo:

– Dar-te-ei todo este poder e a sua glória, porque a mim me foi entregue e dou-o a quem quero; portanto, se tu me adorares, tudo será teu.

E Jesus, respondendo, disse-lhe:

– Vai-te, Satanás; porque está escrito: adorarás o Senhor teu Deus e só a Ele servirás.
Lucas, cap. V, vs. 5-8.

Era ele que erguia casas
Onde antes só havia chão.
Como um pássaro sem asas
Ele subia com as casas
Que lhe brotavam da mão.
Mas tudo desconhecia
De sua grande missão:
Não sabia, por exemplo
Que a casa de um homem é um templo
Um templo sem religião
Como tampouco sabia
Que a casa que ele fazia
Sendo a sua liberdade
Era a sua escravidão.

De fato, como podia
Um operário em construção
Compreender por que um tijolo
Valia mais do que um pão?
Tijolos ele empilhava
Com pá, cimento e esquadria
Quanto ao pão, ele o comia...
Mas fosse comer tijolo!
E assim o operário ia
Com suor e com cimento
Erguendo uma casa aqui
Adiante um apartamento
Além uma igreja, à frente
Um quartel e uma prisão:
Prisão de que sofreria
Não fosse, eventualmente
Um operário em construção.

Mas ele desconhecia
Esse fato extraordinário:
Que o operário faz a coisa
E a coisa faz o operário.
De forma que, certo dia
À mesa, ao cortar o pão
O operário foi tomado
De uma súbita emoção
Ao constatar assombrado
Que tudo naquela mesa
– Garrafa, prato, facão – 
Era ele quem os fazia 
Ele, um humilde operário, 
Um operário em construção. 
Olhou em torno: gamela 
Banco, enxerga, caldeirão 
Vidro, parede, janela 
Casa, cidade, nação! 
Tudo, tudo o que existia 
Era ele quem o fazia 
Ele, um humilde operário 
Um operário que sabia 
Exercer a profissão.

Ah, homens de pensamento 
Não sabereis nunca o quanto 
Aquele humilde operário 
Soube naquele momento! 
Naquela casa vazia 
Que ele mesmo levantara 
Um mundo novo nascia 
De que sequer suspeitava. 
O operário emocionado 
Olhou sua própria mão 
Sua rude mão de operário 
De operário em construção 
E olhando bem para ela 
Teve um segundo a impressão 
De que não havia no mundo 
Coisa que fosse mais bela.

Foi dentro da compreensão
Desse instante solitário
Que, tal sua construção
Cresceu também o operário.
Cresceu em alto e profundo
Em largo e no coração
E como tudo que cresce
Ele não cresceu em vão
Pois além do que sabia
– Exercer a profissão –
O operário adquiriu
Uma nova dimensão:
A dimensão da poesia.

E um fato novo se viu
Que a todos admirava:
O que o operário dizia
Outro operário escutava.

E foi assim que o operário
Do edifício em construção
Que sempre dizia sim
Começou a dizer não.
E aprendeu a notar coisas
A que não dava atenção:

Notou que sua marmita
Era o prato do patrão
Que sua cerveja preta
Era o uísque do patrão
Que seu macacão de zuarte
Era o terno do patrão
Que o casebre onde morava
Era a mansão do patrão
Que seus dois pés andarilhos
Eram as rodas do patrão
Que a dureza do seu dia
Era a noite do patrão
Que sua imensa fadiga
Era amiga do patrão.

E o operário disse: Não!
E o operário fez-se forte
Na sua resolução.

Como era de se esperar
As bocas da delação
Começaram a dizer coisas
Aos ouvidos do patrão.
Mas o patrão não queria
Nenhuma preocupação
– "Convençam-no" do contrário –
Disse ele sobre o operário
E ao dizer isso sorria.

Dia seguinte, o operário
Ao sair da construção
Viu-se súbito cercado
Dos homens da delação
E sofreu, por destinado
Sua primeira agressão.
Teve seu rosto cuspido
Teve seu braço quebrado
Mas quando foi perguntado
O operário disse: Não!

Em vão sofrera o operário
Sua primeira agressão
Muitas outras se seguiram
Muitas outras seguirão.
Porém, por imprescindível
Ao edifício em construção
Seu trabalho prosseguia
E todo o seu sofrimento
Misturava-se ao cimento
Da construção que crescia.

Sentindo que a violência
Não dobraria o operário
Um dia tentou o patrão
Dobrá-lo de modo vário.
De sorte que o foi levando
Ao alto da construção
E num momento de tempo
Mostrou-lhe toda a região
E apontando-a ao operário
Fez-lhe esta declaração:
– Dar-te-ei todo esse poder
E a sua satisfação
Porque a mim me foi entregue
E dou-o a quem bem quiser.
Dou-te tempo de lazer
Dou-te tempo de mulher.
Portanto, tudo o que vês
Será teu se me adorares
E, ainda mais, se abandonares
O que te faz dizer não.

Disse, e fitou o operário
Que olhava e que refletia
Mas o que via o operário
O patrão nunca veria.
O operário via as casas
E dentro das estruturas
Via coisas, objetos
Produtos, manufaturas.
Via tudo o que fazia
O lucro do seu patrão
E em cada coisa que via
Misteriosamente havia
A marca de sua mão.
E o operário disse: Não!

– Loucura! – gritou o patrão
Não vês o que te dou eu?
– Mentira! – disse o operário
Não podes dar-me o que é meu.

E um grande silêncio fez-se
Dentro do seu coração
Um silêncio de martírios
Um silêncio de prisão.
Um silêncio povoado
De pedidos de perdão
Um silêncio apavorado
Com o medo em solidão.

Um silêncio de torturas
E gritos de maldição
Um silêncio de fraturas
A se arrastarem no chão.
E o operário ouviu a voz
De todos os seus irmãos
Os seus irmãos que morreram
Por outros que viverão.
Uma esperança sincera
Cresceu no seu coração
E dentro da tarde mansa
Agigantou-se a razão
De um homem pobre e esquecido
Razão porém que fizera
Em operário construído
O operário em construção.